Um grande papel alvo.
De tão alvo me assusta e me desafia.
O que vou desenhar?
Com quais cores vou preenchê-lo?
Puxando o fio da meada da vida lembrei-me que quando criança, nada disso me assustava, pelo contrário, quanto mais branco, quanto mais espaço eu tivesse para preenchê-lo com desenhos me animava.
Seria o descomprometimento com o resultado, a falta de responsabilidade sobre a arte final?
Nesta manhã um tanto cinza, um tanto fria, diante do papel branco me encarando resolvi fazer uma
volta ao meu passado.
Me ví deitada no chão, de bruços, sobre o chão de tacos pequenos, alguns soltos que me incomodavam na barriga. Nada disso importava, a mesa era pequena demais para desenhar. A minha blusa que ficava suja nos cotovelos e na barriga em contato com o chão não importava, eu só queria desenhar.
Desenhar simplesmente! Simplesmente me fazer feliz.
O que me instigava era a certeza de que eu poderia construir o meu mundo de faz de conta com as minhas próprias mãos, apenas com a ajuda do lápis e papel. Um mundo só meu, onde seria tudo que eu quisesse!
Eu era a princesa, era bonita, era boazinha, era alta, magra, rica e um principe a me cortejar.
Enquanto ia desenhando também ia falando alto as falas de cada personagem, precisava me desdobrar!
Empostar a voz nas falas do príncipe, afinar a voz nas falas da princesa e assim meu dia acabava rapidinho
juntamente com os papéis e os lápis. O papel era um grande problema. Numa época em que não tínhamos condições de comprar sulfites muito menos cadernos de desenhos que não fossem para serem usados na escola. Mas existiam os papéis de embrulhos que eram acirradamente disputados entre mim e minha irmã.
Todos os papéis que entravam na casa eram desamassados e divididos igualmente para as duas, milímetro por milímetro. E assim éramos plenas e felizes! Hoje contemplo com alegria meus sobrinhos empilhando cadernos e cadernos de desenhos com as folhas preenchidas com arte, liberdade e criatividade.
E com que perfeição, dedicação representam o mundo real e o imaginários deles! Parece que nasceram outro dia mas sabem representar perfeitamente, através dos desenhos, a vida que imaginam, sentem e vêem.
Desenhar, preencher um papel alvo e intocável é como viver, pensei.
Quando crianças nada tememos, se errarmos, fazemos de novo ou não erramos pois não tememos.
Crianças sabem viver, sabem aproveitar cada minuto do dia e sabem amar a vida com maestria.
E elas nos ensinam muito. Ensinam que mesmo adultos não podemos jamais esquecer a pura alma infantil, o olhar curioso sobre a vida, simplesmente fazer porque amamos e amarmos o que fazemos.
Pensar em tudo isso me deixou cheia de disposição para encarar o meu papel branco e continuar a preenchê-lo, assim como a vida, com amor e dedicação.
Feliz Dia das Crianças.. a nossa criança interna e eterna!
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